- O autor inicia o texto com a tese a ser
defendida em todo o seu decorrer: a relação entre pensamento e linguagem muda
quantitativa e qualitativamente durante o processo de desenvolvimento da criança.
- Ressalta a independência das raízes genéticas de
pensamento e linguagem e passa a tratar de experimentos com chimpanzés,
realizados principalmente por Köhler, que tiveram por objetivo verificar nos
antropoides os motivos pelos quais o desenvolvimento cultural resulta
impossível para os animais.
-
Embora apresentem rudimentos de linguagem
(semelhantes à linguagem humana predominantemente nos aspectos fonéticos), os
chimpanzés não a utilizam a não ser com um tom emocional, capaz de influenciar
os comportamentos de outros animais da mesma espécie (meio de contato emocional
ou “contágio”) sem, entretanto, significar/representar ou descrever algo
objetivo. O animal tem sua percepção e sua inteligência limitadas ao campo
visual direto, à situação imediata, o que constitui a condição inclusive para o
uso de instrumentos (aqueles que estiverem fora do alcance da visão deixam de
existir objetivamente na qualidade de instrumentos).
-
Vigotski corrobora a ideia de Bühler, segundo a
qual as formas mais evoluídas do pensamento técnico instrumental não se
relacionam com a linguagem e com os conceitos, o que demonstra que as relações
entre pensamento e linguagem, mesmo no adulto, não são constantes e não estão
presentes em todas as suas atividades. Contrapõe-se, no entanto, ao pressuposto
do autor segundo o qual a criança tomaria consciência da palavra como símbolo
ainda antes dos dois anos de idade.
-
Os estudos vigotskianos permitem afirmar que:
1. Tanto
na filogênese quanto na ontogênese, pensamento e linguagem possuem raízes
genéticas diferentes.
2. Seu
desenvolvimento segue linhas distintas e independentes uma da outra.
3. No
desenvolvimento filogenético, a relação entre pensamento e linguagem assume
diferentes magnitudes.
4. Ao
estudar os chimpanzés é possível verificar algumas aproximações em relação aos
seres humanos: sua linguagem possui desenvolvido aspecto fonético, além das funções
emocional e social. Já seu intelecto se aproxima do humano pela capacidade
rudimentar de empregar instrumentos.
5. Nos
chimpanzés pensamento e linguagem não guardam entre si nenhum tipo de conexão.
6. Na
filogênese e na ontogênese é possível reconhecer uma fase pré-linguística do
pensamento e uma fase pré-intelectual da linguagem.
7. É
possível concluir que as raízes do pensamento e da linguagem humanas estão no
reino animal. O uso de instrumentos pelos chimpanzés denota isso, como advertiu
Marx. No entanto, cabe ressaltar que se trata de raízes distintas para o
pensamento e para a linguagem.
-
De acordo com Vigotski, na fase pré-intelectual
do desenvolvimento, durante o primeiro ano de vida, a função social da
linguagem se desenvolve intensamente. A criança em contato com os adultos
desenvolve, desde muito cedo, recursos comunicativos em resposta às atividades
comunicativas estabelecidas por eles.
-
Por volta dos dois anos de idade as duas linhas
até então separadas se juntam e a criança faz, segundo Stern, a maior
descoberta de sua vida: a de que cada coisa possui um nome. Verifica-se, então,
a ampliação ativa do vocabulário da criança, de forma extraordinariamente rápida.
-
Podemos entender que desde o momento de
intersecção, o pensamento se verbaliza e a linguagem se intelectualiza.
-
Em contraposição a Watson (cujo intento de
descobrir o elo intermediário entre a linguagem externa e a linguagem interna é
bastante meritório), Vigotski ressalta que não existem razões para admitir que
a linguagem interna resulte apenas de um processo mecânico de redução
progressiva da sonoridade (fala externa è
sussurro è fala interna). Existem
diversas justificativas que permitem chegar a esta (contra)posição:
estruturalmente, o sussurro não se diferencia da fala em voz alta nem apresenta
as características específicas da linguagem interna; não possui nenhum traço
funcional da linguagem interna; embora possa ser despertado na criança, não se
desenvolve espontaneamente antes da idade escolar.
-
Neste caminho, Vigotski afirma que a linguagem
egocêntrica assume a função de elo intermediário entre a linguagem externa e a
linguagem interna. Não se trata, pois, de mero acompanhamento da atividade
infantil, tendo em vista que, com grande facilidade, se converte em pensamento,
com uma função planificadora que auxilia a resolução de dificuldades no
decorrer das atividades da criança.
-
A linguagem se internaliza psicologicamente
antes que fisiologicamente. Esta afirmação vigotskiana se justifica pelo fato
de que a linguagem egocêntrica da criança é uma linguagem para si mesma,
interna por sua função e quase incompreensível para aqueles que a rodeiam.
-
Mas por que a linguagem se internaliza? Vigotski
afirma que, assim como todas as demais funções psíquicas, a linguagem passa por
quatro etapas fundamentais.
o Etapa
primitiva ou natural: a operação se apresenta da mesma forma em que se formou
nas primeiras fases do comportamento (etapa pré-intelectual da linguagem –
balbucio - e etapa pré-verbal do pensamento – pensamento visual por ações);
o Etapa
da psicologia ingênua: a criança se relaciona com seu próprio corpo ou com os
objetos ao seu redor de forma
imperfeita, experimental, tateante. Em relação à linguagem, corresponde ao uso
de estruturas e formas gramaticais sem a compreensão das relações lógicas que
as fundamentam;
o Etapa
do signo externo: O apoio para o exercício das funções psíquicas está
externamente posicionado (uso dos dedos como apoio para contar; de objetos para
lembrar). Em relação à linguagem, trata-se da fala egocêntrica.
o Etapa
de “crescimento para dentro”/ internalização: conversão da operação externa em
operação interna, com profundas modificações. Trata-se do cálculo mental, da
memória lógica e, na linguagem, da fala interna.
-
Com relação à criança, cabe salientar que, de
acordo com Wallon (e diferentemente do que afirma Stern), as primeiras palavras
não são mais que um dos atributos dos objetos, não constituindo símbolos. Esta
asserção também confirma dados da pesquisa piagetiana. Não há, assim, a menor
possibilidade de que a criança, aos dezoito meses, possa descobrir as
propriedades simbólicas da linguagem. Trata-se do domínio da estrutura externa
que é anterior ao domínio da estrutura interna (palavra-objeto è estrutura simbólica).
-
Ao enfocar a relação entre linguagem e
pensamento cabe salientar, sobretudo, que se trata de um desenvolvimento não
natural, mas historicamente condicionado. A linguagem interna resulta da
acumulação de prolongadas mudanças funcionais e estruturais da linguagem
externa. A diferenciação progressiva entre as funções social (comunicativa) e
egocêntrica (controle da conduta) produzem/são produzidas por tais
transformações. As novas estruturas da linguagem se convertem, pois, em estruturas fundamentais do pensamento.
-
A experiência sócio-cultural da criança e o
domínio da linguagem (meios sociais do pensamento) permitem que o pensamento
infantil se estruture sobre novas bases.
-
Vigotski salienta que no adulto não é possível
identificar os processos da linguagem e do pensamento. O pensamento verbal não
esgota todas as possibilidades tanto do pensamento quanto da linguagem (é o
caso do pensamento instrumental e técnico, bem como da inteligência prática).
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